Meu projetinho de literatura de 2019 envolvia “reprisar” algumas obras que eu já havia lido há tanto tempo que já não me lembrava de quase nada, ou que eu era literalmente outra pessoa quando li.
Praticamente todos os clássicos da literatura brasileira foram experimentados por mim (e pela maioria das pessoas com quem conversei) na fase da vida de entrar na faculdade, pressionada pelos pontos que queria para passar no vestibular. Tenho pelo menos o mérito de ter lido, embora conheça dezenas de colegas que ficaram pela resenha mesmo.
Fiquei matutando o seguinte: não pode ser à toa que algo entra como grade obrigatória dos processos seletivos, ano após ano. Tem que ter algo de muito valor ali, para ser insistentemente cobrado dos adolescentes e jovens.
Então porque será que depois de “crescida” eu não vou descobrir o que era?
Comecei pelo Policarpo e só posso achar uma brincadeira da vida. As semelhanças com o Brasil de 2019 são tantas e tão caricaturais, que Lima Barreto se assombraria se fosse convidado a dar um passeio pelos dias de hoje.
Não vou aqui resenhar uma obra que está exaustivamente esmiuçada na internet, para os adolescentes que não querem ler. Eu recomendo que você leia, sinceramente. Se não pela crítica, nem pelas ironias e semelhanças, pelo texto. Sério, que texto maravilhoso.
É um prazer sensorial degustar as frases que vão contando como as ideias se passam dentro da cabeça dos personagens. Todos os que aparecem, têm o seu ponto de vista exposto pelo narrador onisciente, e você vai meio que pegando afeto por eles, sabe?
Policarpo mesmo é um “sabor” a mais, com a sua ingenuidade, com o amor pelos estudos e pela ciência, pelo Brasil. Pela infinita boa vontade, pelo seu senso moral e laborativo, pelo seu otimismo.
Para mim, que trabalho numa empresa pública federal, é impossível não identificar as infinitas semelhanças com a estrutura burocrática do início do Brasil República. Aqueles poderes que são minúsculos, mas que mudam as vidas de quem orbitam ao seu redor.
Particularmente, a parte que mais achei curiosa e divertida foi a terceira (o pano de fundo é a Revolta da Esquadra, que confesso nem lembrar muitos detalhes), com as cenas mais cômicas e em que os conflitos pelo pequeno poder e pelo status ficava mais evidentes.
Mas o livro como um todo é muito bom! Divertido de ler, cheio de camadas de críticas, toca em várias questões que hoje estão explodindo (como o racismo e as favelas do Rio), e passa num instante.
Próxima empreitada (já em curso) é o Memórias Póstumas de Brás Cubas – lembro que cheguei a encenar no segundo ano do ensino médio, e esqueci quase toda a história!